Interdisciplinaridade na pesquisa precisa vencer resistência
Pesquisadora da Unesp debate o tema nos Diálogos Transdisciplinares e defende diálogo na produção científica


A produção científica no segmento das ciências humanas ainda está atrelada à natureza solitária que remonta ao final da Idade Média, no século 14. Passados mais de 600 anos, a efetiva globalização torna o mundo sem fronteiras – com barreiras geográficas eliminadas pela internet – e surge a necessidade do pensar e produzir coletivo, ainda que seja pela “contaminação da ignorância”, pela qual o interagir obriga que pessoas de diferentes formações acadêmicas passem a conhecer um a área do outro. Ainda assim, a interdisciplinaridade precisa vencer a resistência ao diálogo na produção científica.
Com este pensamento, a pesquisadora Mariana Cláudia Broens, palestrou sobre a abordagem sistêmica e a interdisciplinaridade na investigação de problemas contemporâneos. O terceiro encontro do projeto de extensão Diálogos Transdisciplinares em Meio Ambiente e Educação, promovido pelo Núcleo Institucional de Pesquisas Multidisciplinares (Nipem) da Unoeste ocorreu no final de tarde desta quinta-feira (27), com seleto público de 25 pessoas, entre professores e alunos de pós-graduação stricto sensu.
Para a pesquisadora do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Filosofia do campus da Unesp em Marília, nas ciências humanas existe grande dificuldade de estabelecer parcerias interdisciplinares, em razão da natureza solitária da pesquisa disciplinar. Ela tomou a obra de Francesco Petrarca (1304-1374), De Vida Solitária, como marco inicial dos pensadores que passaram séculos defendo a tese de que para pensar é preciso estar só, afastado das multidões, longe do barulho, em pleno silêncio. Chegou a Philip Coch, em 1994, que pregava as seguintes vantagens da solidão: liberdade, sintonia consigo mesmo, sintonia com a natureza, perspectiva reflexiva e criatividade.
“Daí o princípio básico de que o exercício reflexivo exige um distanciamento em relação ao objeto da reflexão”, disse a doutora Mariana e questionou o estilo da produção nas humanidades atualmente no Brasil e se permanece a produção solitária. Num apanhado de publicações de pesquisadores bolsistas mostrou que são raras as produções em coautoria. Visão referendada pela pró-reitora de Pesquisa e Pós-graduação da Unoeste, doutora Zizi Trevizan. Ela contou que há alguns anos a coautoria era vista como antiética, em razão do pensamento de que um pesquisador se amparava no outro. “Só agora isso está mudando”, disse Zizi durante intervenção na palestra.
Para a doutora Mariana, mudança de mentalidade é o que mais demora e a arraigada ideia de solidão dos pensadores quebra a possibilidade de parcerias na própria área disciplinar. Porém, questiona: Esse modelo de produção solitária é capaz de enfrentar desafios contemporâneos, especialmente no que se refere a objetos de investigação complexa? Disse ser fundamental o tipo de pesquisa atual, mas que é preciso ampliar o campo entre as pessoas da mesma área e de outras áreas, para se obter maior quantidade de pesquisas teóricas. “Quanto mais olhares sobre o objeto, mais condições de perspectivas. Com essas perspectivas compartilhadas, melhor será dissecado o objeto da pesquisa”.
A pesquisadora disse que nos últimos 15 anos o mundo mudou radicalmente, sendo que antes as relações das pessoas se davam por proximidades geográficas e hoje não existem mais fronteiras. Comentou que o avanço tecnológico propiciou a criação de interface homem/máquina, com a implantação de chip no cérebro, em cirurgia para estimulação cerebral. A separação entre humano e não humano fica cada vez mais tênue e a geografia em questão de espacialidade requer outras áreas para estudar. Assim, entende que os pesquisadores devem apostar na interdisciplinaridade, “pois tem tudo a ganhar e nada a perder; porém, se ganhar, amplia o alcance, se perder, entenderá que aquele não é o caminho”.
A efetivação da pesquisa interdisciplinar requer vocabulário comum às disciplinas envolvidas, que seja um diálogo efetivo e que permita incorporar várias contribuições teóricas e metodológicas de modo a produzir um novo conhecimento, conforme a doutora Mariana que esteve na Unoeste a convite da doutora Caroline Kraus Luvizotto, que leciona nos dois programas de mestrado da Unoeste envolvidos nos Diálogos Transdisciplinares. Ao final dos debates, o presidente do Nipem e coordenador do mestrado em Meio Ambiente, doutor Gustavo Maia Souza anunciou um novo encontro do projeto para o dia 9 de outubro, com o doutor Carlos Sampaio que é da área de ciências ambientais da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação.
Notícia disponibilizada pela Assessoria de Imprensa da Unoeste