Desastre ambiental no RS é destaque em fórum do Enepe
Atendimento de Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear no maior desastre natural da história do país e pouco explorado pela mídia norteou palestra conduzida pelo major do Exército Brasileiro, Carlos Eduardo Santos Bonfim

No segundo dia do Encontro Nacional de Ensino, Pesquisa e Extensão (Enepe 2024), o que a mídia e os veículos de comunicação não mostraram na cobertura jornalística acerca da crise climática que arrasou o estado do Rio Grande do Sul (o maior desastre natural da história do país), foi evidenciado no 17º Fórum Regional de Meio Ambiente.
Com o tema “A experiência no atendimento de Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear (DQBRN) ao desastre ambiental no Rio Grande do Sul em 2024", o major do Instituto de Defesa Química, Biológica, Radiologica e Nuclear (IDQBRN) e chefe do Laboratório de Modelagem de Consequências e Análise de Riscos (Lamcar) – ambos do Exército Brasileiro com sede no Rio de Janeiro –, Carlos Eduardo Santos Bonfim, trouxe relato da experiência in loco que viveu nessa tragédia junto com a sua equipe de trabalho formada por 32 militares do Exército Brasileiro e da Marinha do Brasil.
O principal público alvo eram professores e alunos da pós-graduação. A coordenadora do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional (Madre), a Dr. Alba Regina Azevedo Arana, que também lidera o Grupo de Logística Sustentável da Unoeste, falou da importância de discutir essa temática tão atual no fórum liderado pelo programa e que desde 2012 foi incluído e se consolidou como um dos principais eventos dentro da programação do Enepe.
“Queríamos trazer uma reflexão em cima das ações de desastres ambientais, pois os nossos alunos têm vários projetos relacionados a impactos ambientais. A gente tem um último Prointer [Programa de Pesquisa Interdisciplinar] que é sobre as mudanças climáticas. Então a contribuição desse relato vem ao encontro desse entendimento. É uma discussão oportuna para que os alunos possam entender quais as consequências ambientais, sociais e econômicas desses desastres, por quem vivenciou isso”, destacou ela.
A Dra. Alba não tem dúvidas de que é importante essa abordagem num momento em que a humanidade parece ter perdido o controle e a dominância das questões climáticas. “As mudanças climáticas hoje são um ponto de partida dentro das universidades que estão estudando como essas consequências, do aquecimento da terra, do oceano, podem provocar essas questões. E, na verdade, o espaço e o planejamento urbano têm que se dar conta disso e colocar no seu planejamento como essas interferências que são globais, podem ter ações locais. Porque isso que é, na verdade, o ponto importante: como nós, do ponto de vista local, podemos entender e agir nesse sentido”.
Experiências no Rio Grande do Sul
O palestrante do Fórum Regional de Meio Ambiente, que também é doutorando em Engenharia de Defesa no Instituto Militar de Engenharia do Exército Brasileiro, abriu seu momento de fala relatando a experiência profissional que teve na tragédia do Rio Grande do Sul enquanto militar do IDQBRN e chefe do Laboratório de Modelagem de Consequências e Análise de Riscos (Lamcar).
Ao público, foi contando detalhes do seu grupo de trabalho mobilizado na Operação Taquari 2, uma força-tarefa do Governo Federal que mobilizou em todo o país mais de 19,5 mil militares da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. É que as chuvas, enchentes e enxurradas no Rio Grande do Sul atingiram 478 dos 497 municípios gaúchos e afetaram 2,4 milhões de pessoas — mais de um quinto da população local. Foram milhares de desalojados, além de mortos e desaparecidos.
Por ter vivenciado esse cenário catastrófico, ele compartilhou como foi feita a identificação do perigo, análise de risco no local e a abordagem das equipes durante todo o trabalho que por uma semana se concentrou no bairro Fátima, um dos mais afetados no município gaúcho de Canoas.
“Foram muitas as dificuldades logísticas e operacionais, principalmente relacionadas com os cidadãos, os indivíduos que foram muito afetados. A maioria ali, talvez 90%, perdeu tudo. Mobilizamos 32 homens que foram divididos em equipes de trabalho. E essas equipes trabalharam na análise, identificação, detecção, coleta e envio das amostras para o Rio de Janeiro para uma análise mais fidedigna, sem erro confirmativo”, contou.
Esse trabalho in loco gerou um relatório que levou um tempo corrido de 15 dias para ser concluído. Esse relatório indica, por exemplo, a partir de análise da água substâncias químicas relacionadas à convenção ou não. “A contribuição desse relatório para a sociedade é bem ampla. O Exército Brasileiro tem a capacidade de identificar os riscos relacionados a artefatos de destruição em massa que podem envolver substâncias químicas, substâncias biológicas, radiológicas e nucleares. Então a contribuição é para a segurança nacional”.
Lições Aprendidas
Há praticamente 20 anos no Exército Brasileiro, Carlos Eduardo também compartilhou as lições aprendidas nesse tipo de atuação que para ele foi, se não, a mais desafiadora nas Forças Armadas até agora. A primeira é que a resposta precisa sempre ser rápida, uma vez que essa intervenção imediata é crucial para conter riscos químicos e proteger a população. A segunda tem tudo haver com a comunicação, já que por meio de um trabalho de educação é fundamental conscientizar a comunidade quanto a atitudes perigosas que podem gerar riscos químicos, para que estes possam ser evitados.
A terceira lição aprendida é o planejamento de desastres, ou seja, empresas e autoridades devem ter planos de contingência sólidos para crises. E por fim, gestão de resíduos, onde as regras mais rígidas são necessárias para armazenar produtos químicos em áreas de risco.
“A importância da rápida resposta e coordenação eficaz em emergências é essencial, especialmente em áreas afetadas por desastres naturais. A colaboração entre autoridades e a comunidade, aliada a uma comunicação clara sobre os riscos, é fundamental para mitigar os danos. E as lições aprendidas reforçam a necessidade de planejamento, conscientização e melhorias nas normas de enfrentamento”, reforçou ele.
Contribuições significativas
Pesquisador vinculado à Unoeste e professor do Programa de Pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional, o Dr. Edson Ramos de Andrade que é ainda especialista na área de Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear e orientador do palestrante no Instituto Militar de Engenharia do Exército Brasileiro, falou da contribuição da temática abordada no fórum.
“Essa tragédia que aconteceu lá no Rio Grande do Sul é especialmente interessante porque ela envolve todas as agências que se pode imaginar dentro do Brasil. Ela é multidisciplinar, porque é uma área muito complexa que tem atividade tecnológica intensa e, isso, faz com que também as ameaças sejam eminentes. Nós temos ali fábricas de material químico, utilizadores de material radiológico, nuclear, biológico, enfim, uma série de ameaças que quando colocou água sobre tudo isso acabou que liberou esses materiais para o ambiente e que pode provocar danos que se não são conhecidos individualmente, eles podem se complexar e fazer um dano somado”, expôs.
Durante a atividade pela manhã que ocorreu no Auditório Ipê do Bloco B3 do campus 2, além da palestra, os participantes também se dividiram em grupos para debaterem assuntos correlacionados a DQBRN.
“Esse é o momento em que temos a oportunidade de falar com especialistas que são de áreas muito específicas e que quase não tem acesso a essas informações ou pouco se conhece a respeito. Enquanto o Carlos fala do aspecto químico com um grupo, eu vou expandir isso para o aspecto mais geral. E como o nosso público aqui hoje são os tomadores de decisão ou os que dão suporte a tomadas de decisão, quanto mais estiverem envolvidos com esse tipo de temática que é multidisciplinar e multiagência, multifatorial, melhor vai ficar a percepção que a gente chama de consciência situacional”, detalhou Dr. Edson.
Essa consciência situacional citada por ele acaba melhorando a qualidade da informação propagada. “O verdadeiro tomador de decisão que normalmente está no campo político, acaba sendo mais dirigido para acertar. Fica dirigido mais ao acerto do que propriamente uma decisão tomada com viés políticos muito mais intensos. Quando o suporte tecnológico e técnico é muito bom, isso diminui um pouco”, concluiu.
Notícia disponibilizada pela Assessoria de Imprensa da Unoeste